quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Fugaz

Assim como o tempo desembarca em nós e nos faz passar

as palavras que eu tenho, por muitas vezes desencontradas de si

me mostram que o tempo é uma ferramenta de nós mesmos

cheio de imperfeições, adequado ao que flui

antiquado ao que se estagna na essência resignada

que fere almas com o furor de não se viver

em busca apenas de contemplar-se diante de um tempo frágil

banal e de pequena eternidade.

 

Velejamos na areia do destino rodeados de certezas

armados com o nosso medo do que não controlamos

isso porque achamos que a areia é o calmo mar ao nosso comando

isso porque acreditamos que estamos velejando

mesmo quando parados de pés fincados em chão de rocha dura.

E nele, sabemos tudo o que pudemos aprender

vendo nossos pés parados, estagnados,

amados assim, armados de correntes de areia em um mundo morto.

 

Logo ao início desse tempo eu vi que a vida era infinita,

abracei-me à sua insanidade e descobri

que insana era a minha vontade de ser dono de mim

e assim, aliado ao fluxo desordenado da luz que se dobra ao tempo

pisei sobre as palavras e deslizei para fora do monte de areia.

 

O tempo que passa não passa se passamos com ele

mas passa vertiginosamente se lutamos contra sua inevitabilidade

que nos deixa a saudade do movimento que nunca aconteceu

e parados, amamos o ponto perdido para onde nunca paramos de olhar

e de procurar o caminho,

mas não há caminhos quando não existe movimento.

 

Eu não subtraio-me do tempo com as minhas palavras,

eu me agrego a ele, passando-me como fugaz que sou,

tão fugaz como o não existir, tão real como o nunca visto,

tão perto como o não tocado, tão vivo como o que já se foi.

Alheio à missão do tempo eu não sou velho, novo,

ou coisa alguma, já que passei de mim a mim mesmo

e ouço a canção da vida

tão silenciosa que jamais será ouvida, ou esquecida.

 

Tudo passa.

Tudo torna-se poeira do tempo.

A vida só existe porque desmanchamo-nos em existência.

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