Um homem morto pode jogar cartas
a menos que elas estejam no bolso
escondidas
não para trapaças,
mas porque ele não quer vencer.
Você está do outro lado da mesa
com seu sorriso puxado
seus olhos atentos
sua voz que carrega todas as suas
emoções
e eu... aqui desse lado, cheio de
cartas no bolso
que nunca serão jogadas sobre a
mesa
para que eu perca o jogo
antes mesmo dele começar.
Já possuí palavras demais
que mesmo ao irem embora,
continuam aqui
atormentando os meus pensamentos
e me escondendo em uma caverna de poesia onde o tempo esqueceu de passar e eu nunca
aprendi quem eu realmente sou.
Talvez seja tarde demais.
Sempre é tarde demais para quem
se perde do tempo.
Eu não posso arriscar o seu tempo
ao lado do meu
pois eu sei que o instante e o
eterno, para mim, são a mesma coisa.
O efêmero dura para sempre na
minha mente
a dor é indelével, o amor
inexplicável
cheio de nuances confusas e
labirintos indecifráveis
e o fim,
ah o fim nunca chega assim como o
início nunca acaba.
E eu sei compreender tudo como um
velho,
mas posso amar como um garoto
e esse inferno parece um paraíso
feito de ilusão
que não pode ser sonhada
já que a vida real não existe.
A alma precisa de coisas tão
simples,
a mente de tramas tão complicadas
mas a minha mente transpassa minha
alma e busca de complicar as coisas simples
e a alma invade a mente e
simplifica seus labirintos,
mas os deixa sem saída.
Eu estou perdido, mas sei exatamente
onde estou,
porque o lugar é pequeno demais.
A mente sabe como jogar as cartas
a alma quer que elas sejam
jogadas
a poesia me ensinou os movimentos
certos
o tempo confuso deixou as cartas
intactas à decomposição
o universo as perfuma como se
todas as constelações brilhassem em um único sorriso
eu as sinto, como um coração que
bate forte demais para ser interrompido
e fraco demais para me fazer
explodir em palavras de amor
e as cartas, é claro, guardadas
no bolso
escondidas de mim,
mesmo eu sabendo exatamente onde
estão.
Um jogador quebrado precisa de
cartas
mas as teme por saber que elas
perdem e ganham
já que quebrado, ele está perdido
entre seus cacos
menor que uma velha carta sob o
pé de uma mesa
usada apenas para parar o
movimento errado.
E assim meus olhos olham o que
não sabem ver
e minha mente constrói o que
nunca existiu
e eu, jogador de outros tempos,
jogo fora minha euforia
para que meu tempo não sucumba o
sorriso de ninguém.