Eu já fui arrebatado por furacões
já soprei tsunamis,
já provoquei avalanches e fiquei soterrado,
mergulhei no mar profundo, lacei a lua
incendiei, congelei,
já fui tempestade e fui seca prolongada;
pairei no ar acima das nuvens
provei o néctar, bebi o veneno;
já vi o prazer dilacerar todo o meu corpo em sensações,
já vi minha poesia arder como febre louca;
mas também a vi adormecer como se estivesse morta.
Eu acreditei que as emoções que eu buscava
seriam encontradas
quando meu peito explodisse em palavras
quando eu falasse a eternidade
sentisse o impossível
tocasse o infinito.
Então as palavras me transcenderam,
eu vi o que há além do tempo,
atravessei o espaço e a realidade
e acendi um vulcão dentro de mim
que queimaria de felicidade o mundo inteiro.
Mas ele deixou cinzas, a avalanche me congelou,
os furacões me arremessaram contra as pedras
os tsunamis afogaram pessoas,
fiquei sem ar no mar, não alcancei a lua;
o fogo queimou, o gelo feriu, me afoguei na tempestade,
na seca, morri de sede e loucura; caí
quando achei que podia ficar sobre as nuvens,
o néctar era doce demais, o veneno amargo
como as sensações que me dilaceravam e matavam
um pouquinho de cada vez;
feri minha poesia e não explodi em palavras, e sim em agonia;
não fui eterno, impossível ou infinito...
e tudo não passou de ilusão
e meu peito afligia
as mãos tremeram
o coração se apertou
o ar sumiu
e os gritos surdos vieram...
e atrás de mim
a sujeira que eu deixei ao passar e não vi
e os sentimentos nunca satisfeitos
e a felicidade nunca encontrada...
mas viver é um ato gentil,
um presente para que possamos voltar a ser o que somos.
Acalmei os sentidos,
aceitei a solitude,
abracei meu passado e meus erros,
aprendi o perdão por mim,
encontrei meu caminho.
Hoje eu não quero criar como uma explosão,
e sim com a gentileza de quem escuta a alma.
Eu não preciso possuir e dominar a arte,
apenas me basta tocá-la.
Hoje eu não preciso amar estarrecidamente,
com a fúria do prazer saciado;
porque me bastaria um beijo de boa noite
e um sorriso pequeno;
a alma é pequena,
grande é o nosso medo de não amar.
Hoje
me basta sua delicadeza
e a minha
a simplicidade de ouvir um pássaro ao seu lado
ou de compartilhar com você o vento que toca meu rosto.
Hoje
sou a mais simples versão de mim
e caminho ao lado de minhas palavras calmas
guiado pelas flores da estrada...
um sorriso, um oi, um até logo
já bastam para uma felicidade completa.
Hoje
não vou mais arrastar você
pois me tornei calmaria
e posso te convidar a plainar ao meu lado
à altura dos nossos corações...